Dois «sonhadores práticos» no campo das reformas sociais da Medicina: Tomás Judym e José Tomás de Sousa Martins

Autores

  • Anna Kalewska Instituto de Estudos Ibéricos e Ibero-Americanos da Universidade de Varsóvia

DOI:

https://doi.org/10.53943/ELCV.0118_12

Palavras-chave:

Romantismo, positivismo, cientificidade, religião, superstição

Resumo

Depois do romantismo, o passado mítico-lendário foi questionado pela Ciência positivista e pelo espírito de reformas sociais, ganhando novos contornos literários nas obras sensíveis aos problemas da sociedade, patriótica e politicamente empenhadas. A obra de Stefan ?eromski (1864-1925), que, nas primeiras décadas do século xx, era considerado o maior romancista polaco, fez com que a função puramente estética da Literatura perdesse terreno, instigando o lado emocional e a consciência social dos seus leitores, a sua compaixão e vontade de agir. O protagonista do romance Ludzie bezdomni (1900) (Os homens sem teto), doutor Tomás (Tomasz) Judym, é um self-made man que, assumindo a responsabilidade pela miséria das massas do proletariado (primeiro, em Paris, depois, em Varsóvia, em Cisy e na Silésia), renuncia à sua própria felicidade e ao amor de Joaninha, e dedica a sua vida de médico aos pobres e à luta contra a injustiça social. O inconformismo e o empenhamento do doutor Judym como o primeiro «sonhador prático» da causa social tornaram-se proverbiais em polaco, conotando a atitude romântica livre da vontade de lucro financeiro na época do progresso desenfreado do capitalismo.  

José Tomás de Sousa Martins (1843-1897) foi um «sonhador prático» real, uma figura ímpar da Ciência portuguesa, médico e professor catedrático na Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, empenhado gratuitamente no combate à tuberculose. Em 1910, Jaime Cortesão traçou o perfil de Sousa Martins, sublinhando que, em Filosofia, foi positivista, materialista e determinista-fatalista, indo muito além da superstição científica que levava os que prezavam a Ciência para além dos limites do razoável, acrescentemos que também para além do limite da humanidade. Na verdade, Sousa Martins era um pasteuriano convicto e partilhou as ideias científicas do mestre francês. Para Sousa Martins, Pasteur era um dos santos a adorar na vasta religião da Ciência.

O doutor Tomás Judym e Sousa Martins entraram, respetivamente, na Literatura polaca e na História da Saúde Pública em Portugal como «santos laicos», figuras paradigmáticas da ação no campo das reformas sociais, médicos ao serviço do Homem, que não viam na religião o caminho para a sua salvação, mas antes na Ciência. E, também por isso, as figuras dos dois «sonhadores práticos» se tornam ainda mais fascinantes e recomendáveis à apresentação no tempo do debate sobre o espírito das reformas e a (re)construção da modernidade.

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Impressa

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Publicado

11-04-2023

Edição

Secção

Artigos Multitemáticos