As Reformas religiosas e o nascimento da escolarização ocidental
DOI:
https://doi.org/10.53943/ELCV.0124_119-136Resumo
As reformas religiosas do século xvi foram as parteiras da primeira modernidade. Em um momento em que, com a expansão ibérica, os continentes se globalizavam, elas provocaram guerras de religião e uma fragmentação profunda no espaço europeu. Essa confessionalização da sociedade fez emergir um cristianismo mais racionalizado, sendo representado por diferentes igrejas protestantes e pelo catolicismo tridentino e, particularmente, pela Companhia de Jesus. Diferenciando-se do cristianismo medieval, luteranos, calvinistas e anglicanos investiram na criação de suas redes de instituições educativas, provocando uma onda inédita de escolarização, que concorria para dar consistência às práticas religiosas de seus fiéis. A Igreja Católica também se armou, criando escolas paroquiais e, sobretudo, uma rede de colégios jesuíticos que se difundiu no espaço europeu católico, no continente asiático e no Novo Mundo. Os estabelecimentos de ensino da Companhia de Jesus foram unificados, em 1599, por meio da instituição da Ratio studiorum — conjunto de regras escolares jesuíticas, que se converteu
no currículo fundador da escolarização católica na Idade Moderna. Desta forma, o presente trabalho sustenta que as reformas religiosas construíram o nascimento da escolarização ocidental a partir de diferentes matrizes cristãs — protestantes e católica. Trata-se de um deslocamento histórico — no sentido foucaultiano — que faz emergir a escolarização no mundo ocidental, marcada pela disciplina moderna, que é materializada por dispositivos como o controle do tempo, o esquadrinhamento do espaço, a organização das forças, o clima de concorrência e de premiação discente e a ênfase nos castigos morais. Essa questão é lida em três obras histórico-sociológicas recentes publicadas na Europa e na América Latina, quais sejam: Produção da escola/produção da sociedade: Análise sócio-histórica de alguns momentos decisivos da evolução escolar no Ocidente, do sociólogo André Petitat; Arqueología de la escuela, dos sociólogos Julia Varela e Fernando Álvarez-Uría; e A invenção da sala de aula: Uma genealogia das formas de ensinar, dos historiadores Inés Dussel e Marcelo Caruso. Essa reflexão historiográfica, portanto, examina o surgimento da escolarização ocidental, procurando constatar elementos comuns de análise dos três livros, mas também perceber diferenças, especialmente aquelas vinculadas às fundamentações teóricas e aos recortes sócio-espaciais.
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